Aos amantes da boa leitura, transcrevo na íntegra o excelente
artigo de autoria do Coronel de Polícia Reformado Nelson Herrera Ribeiro,
publicado no blog do Cel Ref Paúl. (https://blogcoronelpaul.blogspot.com.br/).
“O
BANDIDO QUE GOVERNOU O RIO CONDENADO A 45 ANOS”
Este título não é de minha autoria. Mas reputo de notável acuidade
jornalística. Foi exibido em vinheta, ontem, dia 21/09, na 1ª edição matutina
do SBT RIO.
Sabe-se, porém, que a pena de Sérgio Cabral já soma mais de 59 anos, e
mais de uma centena de processos onde figura réu aguardam decisão judicial.
Da recente sentença do probo Juiz Federal MARCELO BRETAS,
condenando-o à pena de 45 anos e 2 meses de prisão, destacam-se as afirmativas
de que foi “idealizador do gigantesco esquema criminoso
institucionalizado no âmbito do governo do Estado do Rio de Janeiro”,
bem como “era o chefe da organização, cabendo-lhe essencialmente
solicitar propinas às empreiteiras(…) e dirigir os demais
membros da organização no sentido de promover a lavagem de dinheiro”.
Meu título deste artigo
seria
DESAGRAVO AOS
NOSSOS HERÓIS ESQUECIDOS
Entre os mais refinados criminosos de colarinho branco, Sérgio Cabral
Filho conseguiu ludibriar o incauto eleitorado fluminense. Primeiro, para
eleger-se Deputado estadual, Senador e Governador, e depois, valendo-se do
maciço apoio da mídia comprometida e com o uso de espalhafatosa pirotecnia
policial do delegado PF José Beltrame, seu obscuro secretário de segurança
pública, não só logrou ser reeleito, mas também eleger sucessor seu vice Pezão.
Comprovou ser astuto aventureiro político, chefe supremo dessa
verdadeira quadrilha que arrasou nosso Estado. E, paralelamente, provocou
profundos prejuízos à Polícia Militar, tão graves que a solução demandará talvez
décadas de trabalho saneador.
Até, despudoradamente, sob a complacência de nossos coronéis tentou
fazer negociatas imobiliárias envolvendo o histórico Quartel dos
Barbonos, onde se situa nosso Quartel General, só não o conseguindo por
desistência das empresas construtoras interessadas. Mas esse episódio desnudou
o mal maior: a crise da vergonha na cara.
Os quadros operacionais por excelência – sargentos, cabos e soldados –
já estão marcadamente lacerados, pelo ingresso em massa e pela formação
precária de candidatos, onde o único objetivo era “fabricar” policiais para as
UPP. Circunstâncias plenamente analisadas pelo Cel
PM PAÚL em “UPP – uma farsa eleitoral”, mais
que mero livro, um autêntico Estudo de Estado-Maior.
Com o advento da automática promoção de praças por tempo de serviço, que
aproveitou em massa os integrantes das UPP (quase 10.000 PM), criou-se a
triste figura de cabos e sargentos com quase nenhuma experiência policial, esta
diuturnamente adquirida das diferentes atividades de policiamento.
Golpe sub-reptício, ardilosamente perpetrado por um obscuro delegado PF,
repousado na certeza da inércia dos coronéis, tristes cúmplices do ato
atentatório à própria instituição PM.
Cabral, Beltrame e os coronéis comandantes-gerais no período de 2009 a
2014 deveriam todos responder por homicídio doloso, caracterizado o dolo
eventual, ou, ao menos, por sua tentativa, ante as dezenas de policiais
militares lotados em UPP, que foram mortos e feridos. Em país sério, claro.
Em 2009, dada a conveniente alteração do Estatuto dos Policiais
Militares, pela maioria do governo na ALERJ, Cabral conseguiu reformar, com
uma simples penada de tinta, toda a cúpula de Comando à época, os
autodenominados “Coronéis Barbonos”, que tiveram a ousadia de
exigir publicamente melhores condições de trabalho e justa remuneração. Chefes
honrados e idealistas, que foram precocemente passados à inatividade. Alijados
por implacável, porém atuante, “sistema”.
A nociva consequência maior deu-se, sobretudo, no tocante aos oficiais
superiores (coronéis, tenentes-coronéis e majores), que foram inoculados do
pior vírus que um chefe pode ser contaminado: a subserviência, para a rápida
progressão da carreira, incrementando-se a “autofagia”.
Aos coronéis cabe, por dever de ofício, toda a responsabilidade de
defesa das tradições e valores institucionais da nossa mais que bicentenária
Polícia Militar. Indubitavelmente, inerente ao posto. Não lhes cabe a desídia
nem a omissão. Sob o risco de os subordinados sentirem-se acéfalos. Quando
os chefes perdem a vergonha, os subordinados perdem a confiança.
Aliás, como vem ocorrendo, sob olhar realista, sem hipocrisia. Apenas
servindo a aumentar o vazio entre comandantes e comandados. E, no dizer
popular, o vazio ocupa imenso espaço.
Pairando sobre tudo, restam os inimigos das instituições militares,
internos e externos, que aproveitam para lançar as mais absurdas teorias, sem
quaisquer fundamentos históricos, sociais ou políticos, e sem a necessária
honestidade de propósitos: fusão das polícias civil e militar; carreira única;
extinção da PM; desmilitarização; institucionalização da Força Nacional de
Segurança.
Sérgio Cabral Filho, um reles criminoso, que, por engenho e arte, chegou
ao poder no nosso Estado pôde fazer tanto! Inclusive desrespeitar a
Constituição, afrontar estatutos militares e revogar prerrogativas, para mandar
prender em penitenciária de segurança máxima bombeiros e policiais militares,
que se atreveram a reivindicar humanas condições de trabalho e remuneração
justa.
Valeu-se de muitas artimanhas, inclusive escondendo-se no biombo erguido
pela subserviência dos coronéis, então comandantes-gerais do Corpo de Bombeiros
e da Polícia Militar, que assumiram a responsabilidade pela ação ilegal. Apenas
se assinale-se: não por bravura, mas pela certeza da impunidade. Contavam todos
com a força política do momento, onde conviveram a inércia da Justiça, a
leniência do Ministério Público e a omissão da Ordem dos Advogados do Brasil.
Para eles seriam favas contadas o projeto de futura anistia,
que os poria a salvo. Ante os vários processos judiciais advindos contra esses
chefes(?), diz-se, na sistemática processual, ter havido a perda do
objeto, fazendo com que todas as ações sejam extintas sem resolução
do mérito.
Faz parte do jogo sujo da política e das chicanas jurídicas. Contudo a
casa caiu. O chefão está preso.
Então os militares estaduais já deveríamos ter organizado ato
público de desagravo. Deveríamos todos agradecer formalmente aos
bravos companheiros praças e oficiais que se imolaram em Bangu 1,
para saciar a sanha vingativa de Cabral, um criminoso que mais parecia – sob a
ética dos mafiosos – il capo dei tutti capi [o
chefe de todos os chefes].
À época, como advogado, visitei o Batalhão Prisional do CBMERJ, em
São Cristóvão, tendo sida impedida minha entrada. Mais uma vez, sob a leniência
da OAB. Sucessivamente, fui ao Batalhão Prisional
da PMERJ (então em Benfica), onde pude reunir os referidos praças
presos e mais o Cel Rabelo e o Maj Hélio, nossos heróis esquecidos,
tendo, como reformado, agradecido pessoalmente pelo reajuste de meus proventos,
consequência direta de suas destemidas atitudes.
Não me esqueci de visitar o bravo Cel PM PAÚL, transferido de Bangu
1 para o Batalhão de Choque, capciosamente acusado de crime militar
que não cometeu: o incitamento à greve. Curiosamente, não só se havia
pronunciado, bem como postara diversas matérias em seu blog contra
o ilegal movimento grevista de militares. Mas ele costumava exibir a
faixa “FORA CABRAL!” e já havia protocolado representação no
Ministério Público contra o secretário Beltrame por atos de improbidade
administrativa. De maneira torpe o incriminaram.
Desses históricos movimentos restou o único fruto pessoal para eles – a
profunda covardia de um “sistema” arcaico, empedernido, insensível. E
dilacerantes feridas internas para as instituições Corpo de Bombeiros e Polícia
Militar do nosso Estado. Até quando?
A pretendida democrática luta política, uma
vez eleitos em 2018 nossos lídimos representantes, não implicará passes de
mágica nem medidas revolucionárias para tão graves problemas, cuja solução até
carece de muito tempo. Talvez a longa caminhada de mil passos, mas terá sido
dado o primeiro.
Tão somente consistirá na exigência inabalável do fiel cumprimento da
lei, visando à preservação dos valores e das tradições dessas instituições
históricas. Tornar respeitados os seus valentes integrantes –
bombeiros e policiais militares. Com idealismo e destemor, como nos ensinaram.
Nelson HERRERA Ribeiro, Cel PM Ref, advogado e
professor
Meu Comentário: Com
clarividência inquestionável, o artigo atinge o cerne do problema que assola a
PMERJ de forma contundente. Convido a reflexão de como teria transcorrido
se mais Coronéis tivessem cerrado fileiras com os ideais dos “barbonos”.